20/04/2012

Uma bandeira, búfalos, pôsteres e uma ilha no paraíso.


No Delta do Rio Amazonas, na costa norte da Ilha de Marajó, existem duas ilhas chamadas de Cavianas. A região é conhecida por seus inúmeros igarapés, que avançam terra adentro, criando um litoral entrecortado de reentrâncias e pequenos paraísos para animais silvestres, especialmente aves.

"Caviana de Dentro" é a ilha um pouco maior em extensão, conhecida por ser repleta de morcegos, que são regularmente estudados por biólogos e respeitados pelos ribeirinhos. "Caviana de Fora" é um pouco menor e está mais próxima ao estado do Amapá. Apesar de ambas as ilhas serem cobertas em sua grande parte por áreas de florestas, algumas de difícil acesso, podemos encontrar um grupo de habitantes isolados e espaçados, distribuídos nas margens dos igarapés e em alguns braços de rios.

Entre estes se destaca um dos mais antigos moradores da Ilha de Caviana de Fora. Seu "Antônio Boiadeiro" mora sozinho há mais de 30 anos em uma casa suspensa, devidamente construída para suportar as fortes cheias do Rio Amazonas. A construção é a única habitação no lado norte da Ilha, sendo o ponto de observação principal para que ele tome conta das cerca de 600 cabeças de búfalo indiano que possui em sua fazenda.

Quando cheguei às proximidades de sua casa, após pernoitar em um igarapé próximo, a fim de esperar a maré favorável para entrar no Igarapé das Paineiras, onde reside, a primeira coisa que me chamou a atenção foi a bandeira do Flamengo, exposta na varanda e feita a partir de uma velha toalha de mesa. Ao conversar mais com o Seu Antônio, descobri um rubro-negro apaixonado, que foi ao Maracanã duas vezes na vida, na década de 60, e se orgulha de ter visto Silva Batuta jogar.

"Meu pai me levou em dois grandes jogos com meus tios que na época moraram no Rio. Passamos férias lá e eu fui ver o Flamengo enfrentar o Vasco e o América. Até hoje, quando conto isto aqui, alguns amigos dão parabéns", conta cheio de orgulho.

A casa simples possui uma decoração especialmente cuidada para que o Flamengo se destaque. Dois grandes pôsteres enfeitam a parede e são orgulhosamente apresentados logo que se entra na sala. Seu Antônio afirma ter comprado uma antena e um gerador somente para conseguir assistir aos jogos do Flamengo, que há anos só ouvia pelo rádio, presente do filho que mora em Macapá. Sua próxima aquisição será uma tapeçaria vermelha e preta, já encomendada a uma cooperativa de artesão em Laranjal do Jarí.

"Pedi para as artesãs fazerem ele todo listrado, igual a camisa!"

Sorridente, o solitário rubro-negro se orgulha de ter colocado 8 apaixonados pelo Flamengo no mundo, hoje espalhados pelo país. "E eu pedi a todos que só casassem com flamenguistas de carteirinha", lembra em meio a risadas francas.

Ele conta ainda que este seu desejo se materializou em todos os seus filhos, o que considera mais do que uma vitória. "Ainda tem os netos, que eu não deixarei escapar".

Afinal, todos os anos no natal ele é levado a Belém, onde mora uma das filhas para as comemorações de fim de ano. E nesta data ele compra uma camisa nova do flamengo para cada neto e neta, que até o momento somam um time inteiro.

"Ainda vou bater uma foto com todos eles uniformizados, tipo um time", afirma, sonhando acordado. Uma das filhas prometeu realizar este desejo ainda este ano. E o melhor, na fazenda.

Ali, no delta das terras baixas da foz do Rio Amazonas em meio a exuberante floresta e as terras alagadas, existe um grande rubro-negro que mesmo isolado cuida com carinho deste amor pelo Flamengo.

SRN

Autor: Rodrigo Tolentino Nunes

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